Texto critico da exposição” O centro nada retém”

Com um percurso ligado à pesquisa sobre arte urbana, com destaque para seu projeto “Ectoplasma”, a artista francesa Raphaelle Faure-Vincent propõe em seus recentes desenhos, serigrafias, fotos e gravuras um olhar que desconstrói o urbano, que nos revela o quanto ele é, simultaneamente, dobrado por forças do fora e tencionado por elementos do dentro. Essa tensão entre o dentro e o fora também está presente na atual exposição, intitulada “O centro nada retém”, marcada sobretudo por gravuras em metal.

O que nos atrai no amassado, amarrotado, embrulhado e desarrumado das gravuras de Raphaelle é esse jogo constante entre a leveza da luz e a espessura da matéria. Isso é notável nos trabalhos Octácoro e Variações, por exemplo, onde a luz brota do retorcido do papel por sua profundidade entreaberta. Mesmo quando imaginamos estar diante de uma foto aérea de uma cidade noturna, como em Variações e Expansões, é o amarrotado dos territórios deixando escapar as dobras de luz, o imaterial do peso material. O volume dos trabalhos vive essa espécie de indecisão entre o amassado do papel, o contorcido da matéria e o esgarçamento da luz, o desdobrar dessa interioridade. Não sabemos se foi a matéria que se amassou ou a intensidade da luz que a contorceu.

No fundo, trata-se do dilema mesmo da paisagem urbana que nos rodeia: construções, ruas, fiações, lixos, enfim, pilhas de concreto, vidro e aço empilhados e amassados pelas forças e interesses econômicos, mas tencionados pelas forças da vida, essa força luminosa de um dentro que se desdobra no esforço em permanecer na existência.

Rogério da Costa