Exposição Um dia, uma prosa, um conto

Anny Lemos, 1987, São Paulo        Suzana Barboza, 1970, São Paulo

A exposição Um dia, uma prosa, um conto… apresenta os trabalhos de Anny Lemos e Suzana Barbosa de 13 de julho a 10 de agosto p.f., na Casagaleria e Oficina de Arte, São Paulo.
Para a artista Anny Lemos, suas obras são representações de “metáforas da casa”, ou seja, nessa simbologia, espectadores diagramam olhares sobre as cenas recortadas. São pequenos cantos com móveis querendo transgredir o espaço, intensidades luminosas em superfícies chapadas matizadas por formas luminosas, ou detalhes do cotidiano.
Ao visitante da mostra, nos intervalos dessa arquitetura de sofás, tapetes, cadeiras, janelas, plantas, abajurs, outras camadas se dão a ver. São nervuras que filtram um invisível como reflexo de presenças e ausências, do fixo e do fugidio, do visto e da dúvida sobre o que é visto.
Em suas palavras, Anny afirma que se interessa pelos campos perceptivos se uma poética do habitar, com a qual a visualidade de um mundo interior flui pelas janelas do olhar.

A partir de 2012, Suzana Barboza inicia seus estudos em pintura, dedicando-se à construção de sua linguagem. Estuda com Paulo Pasta, pesquisa procedimentos e técnicas de artistas como Morandi, Mira Schendel, Eleonore Koch e Volpi, entre outros. Comum a esses, são as atmosferas  criadas por Suzana que, ao acessar nossa percepção, nos aproxima de um tecido ordenado no silêncio, no tempo.
Sua palheta, muitas vezes esmaecida (Fig. 4, Sem título, 2024), constrói paisagens abstratas onde espaços de core-luzes encontram-se sugerindo uma matéria etérea. Levados por essas deambulações estéticas, nos aproximamos, como descreve Suzana, de formas reduzidas às suas essências, intencionadas por questões sobre a impermanência do ser, suas imprecisões, derivas e flaneurismos.
Círculos imperfeitos, construídos com pinceladas aparentes tratados à tinta a óleo e cera, traduzem, então, o universo da artista.

Poderia ser um mero acaso, a curadoria colocar junto duas artistas vindas de formações diferentes:- Anny Lemos, artista visual pela UNESP (2010) e Suzana Barboza, arquiteta pela FAU USP (1994). No entanto, motivadas pela busca de diálogo com suas produções atuais, Anny e Suzana, em conversas sobre o projeto da mostra, fizeram surgir alguns passeios de fenômenos estéticos próprios da linguagem da pintura, os quais possibilitaram a motivação curatorial de colocar lado a lado certos trabalhos, sem tratá-los apenas como linguagens figurativa ou abstrata.
As artistas Anny Lemos e Suzana Barboza, ao criarem um diálogo entre si, sobre o mundo da vida e sobre correlações formais transformam Um dia, uma prosa um conto… em um ato que excede os limites de cada obra, motivando-nos com outros passeios estéticos.

Carmen Aranha e Loly Demercian

Julho/2024

Exposição A Leveza Pode Ser o Peso da Nossa História

Texto crítico: Loly Demercian
A Leveza Pode Ser o Peso da Nossa História, 2024
Artistas: Nádia Starikoff e Gaya Rachel
Texto: Loly Demercian

“Antes de formar sua atmosfera e seus oceanos, a Terra devia ter o aspecto de uma bola cinzenta a rolar pelo espaço. Igual ao que é hoje a Lua: ali onde os raios ultravioletas irradiados pelo sol chegam em anteparos, as cores se destroem: por isso, as rochas da superfície lunar, embora coloridas como as da terra, são de um cinza morto e uniforme. Se a Terra apresenta uma face multicor é graças à atmosfera, que filtra aquela luz mortífera”.

                                                                            Ítalo Calvino 1

A exposição “A Leveza Pode Ser o Peso da Nossa História” reúne, de maneira sensível e instigante, os trabalhos de duas talentosas artistas, Nádia Starikoff e Gaya Rachel, cujas pinturas exploram as tensões entre o leve e o pesado, o visível e o oculto, o efêmero e o permanente. Esta mostra não é apenas uma exposição de arte, mas uma imersão profunda nas camadas da memória e da identidade, sugerindo que, frequentemente, o que parece leve carrega consigo um peso histórico inestimável. As duas artistas que compartilham este espaço expositivo tecem, com sensibilidade e sagacidade, um rico tapete de significados que nos desafiam a reconsiderar a nossa compreensão do passado e sua influência sobre o presente.

Ao entrar no espaço expositivo, somos imediatamente envolvidos por uma atmosfera que flutua entre a delicadeza e a densidade. As obras dialogam entre si, criando uma narrativa visual que questiona nossas percepções e desafia nossas suposições. As artistas, com suas técnicas singulares, conseguem traçar paralelos e contrapontos, oferecendo ao espectador uma experiência rica e multifacetada.

A artista Nádia Starikoff utiliza uma paleta de cores suaves, como o azul metileno, que por acaso é um corante utilizado em histologia para colorir as células do nosso corpo, porque não apresentam cor. As cores são para materializar, para tornar visível o invisível.  Na série “leveza” evoca uma sensação de serenidade, seus trabalhos, no entanto, são pontuados por elementos que remetem a memórias pessoais, como fragmentos de imagens e flores. Essa justaposição cria uma tensão visual e emocional, sugerindo que a aparente suavidade da superfície esconde histórias de peso considerável. Suas pinturas são quase como poemas visuais, onde cada camada de tinta revela uma nova nuance de significado.

Em contraste, a outra artista, Gaya Rachel, opta por cores mais vibrantes e contrastantes, com pinceladas enérgicas que conferem movimento e intensidade às suas obras. As cenas representadas, embora dinâmicas e cheias de vida, carregam uma carga emocional profunda. Elementos simbólicos emergem das camadas de tinta, contando histórias de resistência, luta e resiliência. Através de uma abordagem quase abstratas, nos convida a refletir sobre como o peso da história se manifesta no presente, influenciando e moldando nossas experiências cotidianas. Os símbolos, segundo a artista estão entre célula e o universo.

O espectador é levado a percorrer um caminho onde cada obra é um ponto de reflexão, um convite a considerar as múltiplas camadas de nossa existência histórica e cultural. “A Leveza Pode Ser o Peso da Nossa História” é uma exposição que desafia o espectador a olhar além da superfície, a reconhecer a complexidade inerente às experiências humanas. As artistas, com suas abordagens únicas, nos mostram que a história não é apenas um fardo a ser carregado, mas também uma fonte de força e inspiração. Esta mostra é uma celebração da resiliência humana e da capacidade de transformar o peso do passado em uma leveza que nos permite seguir adiante. Em última análise, esta exposição é um tributo à dualidade da vida, uma ode à delicadeza que coexiste com a profundidade, e um lembrete de que a leveza pode, de fato, ser o peso da nossa história.

A união destas duas artistas em “A Leveza Pode Ser o Peso da Nossa História” não é apenas uma justaposição de estilos, mas uma sinergia que amplia a compreensão do espectador sobre a complexidade da história e sua influência contínua. A leveza, neste contexto, não é sinônimo de superficialidade ou ausência de peso, mas uma qualidade que permite uma nova perspectiva sobre o que pode parecer imutável e pesado. Ao caminhar por esta exposição, somos desafiados a reavaliar nossa relação com o passado. As obras nos encorajam a reconhecer a beleza e a dor das narrativas históricas, a entender que a leveza pode ser um véu que encobre um profundo peso e que este peso, por sua vez, pode ser portador de uma estranha e necessária leveza. A exposição nos deixa com uma sensação de reverência e introspecção, instigando um diálogo contínuo sobre como carregamos e interpretamos a nossa história. Em “A Leveza Pode Ser o Peso da Nossa História”, as artistas nos oferecem uma meditação visual sobre a natureza paradoxal da memória e do tempo, um convite para explorar a intrincada dança entre o que é visto e o que é sentido, entre a aparente leveza e o inescapável peso das nossas narrativas compartilhadas.

1-Calvino, Italo. AS COSMICÔMICAS. São Paulo. Companhia das letras, 1992. Pg.51

Exposição Paisagens Ásperas

PAISAGENS ÁSPERAS, 2024

Vitor Mazon¹

Em suas tradições familiares, Vitor Mazon descobriu uma atmosfera propícia para criação, uma percepção diferenciada em relação a marcenaria, fruto do ofício familiar. Era normal esbarrar com sobras de materiais como madeira, pregos, parafusos, lixas de todas as cores e espessuras. Entretanto, Vitor iniciou seu trabalho artístico com o dispositivo fotográfico. Seu olhar o direcionava para os vazios entre a presença das árvores e mata. As imagens, ao serem reveladas, fizeram-no sentir que algo faltara. Era aquele ambiente conhecido da marcenaria: o cheiro de madeira, o tato, a tridimensionalidade. Era preciso inserir toda essa lembrança de alguma forma. Vitor, então, compôs à fotografia, colagens, que evocaram a profundidade – com restos de madeira – e a moldura feita com suas próprias mãos. Suas primeiras paisagens, se originaram da lixa, um instrumento comum, mas com enorme capacidade de mutação, quando aliada a uma mente criativa, capaz de perceber as tensões advindas de sobreposições do material.
Em suas exposições, Vítor procura situar a multiplicidade da linguagem artística projetada naqueles materiais e suportes. São várias técnicas executadas com fluidez. Passa-se de uma para a outra sem detrimento da qualidade e sem que a técnica sobrepuja a linguagem e vice-versa. Mas, Vitor, não satisfeito, inicia pesquisa subjacente a todo pensamento expressado nas diversas séries, trazendo um fato raro na arte hodierna, na qual as formas prontas são apropriadas sem que haja indagação alguma quanto ao procedimento. A surpresa nessa descoberta logo é desvelada, uma vez que o artista realizou inúmeras pesquisas sobre as tensões lineares percebidas nas sobreposições de lixas que compõem cores e formas. Com as marcas de dedos, como se fosse a memória desenhando veios nas madeiras ásperas e lixadas, a linguagem de Vítor se articula. A partir daí, o artista cria paisagens com uma “atmosfera” que não se refere ao insólito, nem à junção ao acaso de elementos díspares, mas àquilo que resulta da reflexão e da experiência criadora de leis da causalidade.
Buscando domínio e boa execução técnica, Vítor deixa seu rigor na unidade e na identidade construída.

Loly Demercian²

¹Vitor Mazon, 1987, vive e trabalha em São Paulo – SP. Sua pesquisa parte da fotografia de paisagem, buscando uma relação entre imagem e matéria. Filho e neto de marceneiros, se formou em jornalismo (2010), com especialização em fotojornalismo pela Spéos Paris – École de Photographie, Paris (2012).
Em 2022 fez sua primeira exposição individual, Sarrafo, na galeria Zipper, com curadoria de Eder Chiodetto. Entre as exposições coletivas de que participou estão: Poéticas Possíveis, Paralela Eixo (2021), Voices of Earth, Art from the Heart (2021), Mostra Museu, Arte na Quarentena (2021).

²Especialista em Estudos de Museus de Arte pelo programa Inter unidades do Museu de Arte Contemporânea do estado de são Paulo, da Universidade de São Paulo (MAC/USP); mestre em Educação, arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie; Doutora em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; curadora de arte e membro do grupo de pesquisa em Comunicação e Criação nas mídias (CCM) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Conversa com os artistas Claudio Barros + Felipe Zorlini

Exposição CNT 2022

Coletiva de Novos Talentos

Sobre a exposição

CNT , 2022

O artista desenvolve pesquisas e experimentações focadas em reflexões acerca do inconsciente, da memória, do tempo e do espaço; a partir de suas interrelações, percepções e das inquietações que então se originam, fazendo um recorte do seu mundo, que, por sua vez, está inscrito em uma matéria, ou seja, a construção de um conhecimento tornado visível nas formas, matérias e nos procedimentos das artes visuais. 

Nesse sentido, para  conhecer os artistas e suas experimentações e pesquisas, lançamos em 2018 a CNT (Coletiva de Novos Talentos). Permanecemos durante dois anos praticamente enclausurados por conta da Covid, mas retornamos em 2022, com a terceira edição,  promovendo a visibilidade de produção de novos artistas e abriremos dia 15 de dezembro às 18h, permanecendo em cartaz até dia 22 de dezembro, inclusive sábado e domingo, na Casagaleria e Oficina de Arte Loly Demercian. 

Nessa edição serão 21 artistas independentes em começo de carreira. O público poderá ver um conjunto de trabalhos em um só espaço, todos foram selecionados e escolhidos pelas curadoras, as profªs Dras. Carmen Aranha e Roseli Demercian (Loly). O projeto tem por objetivo descobrir novos talentos e orientar suas produções e carreira. 

Venham conhecê-los e prestigiá-los!! Todos os trabalhos estarão à venda ! Não percam esta oportunidade !

Os artistas: Alix Spell, Bruno Pastori, Del, Erica Iassuda, Eron Teixeira, Francisco Siwerski, Felipe Zorlini, Gi Ferreira, Gonzalo Fonseca Torres, Isabela Rolim, Jerônimo, Kiko, Lago, Maria Tigre , Nina Nogueira , Pedro Leão , Pinkpeter , Sheila Ortega , Thamyres Donadio, Valeska Rabelo, Vitor Mazon.

O evento proposto é plasmado em duas vertentes: a primeira, uma exposição coletiva com artistas visuais das mais diversas linguagens, tais como:  fotografias, pinturas, gravuras, colagens, esculturas, áudio visuais e instalações. A segunda, os artistas discutirão sobre seus trabalhos e pesquisas. 

Abertura dia 15 de dezembro as 18h. De 16 a 22 de dezembro das 13h às 19h

Conversa com os artistas: Dias 16 e 17 de dezembro. Lives pelo instagram, sempre as 16 h. 

Exposição “E A Memória Insiste” da artista Leila Reinert e “Revistando Leila Reinert” do Coletivo GRUPO 7+

Duas exposições que acontecem na FUNARTE SP

Sobre as exposições

Uma retrospectiva da artista Leila Reinert com a exposição E a memoria insiste “, no espaço  Cultural Funarte, galeria Flavio de Carvalho,  que faleceu em 2019, precocemente. E para homenageá-la faremos uma exposição com os melhores trabalhos de Leila desde de 1997 a 2008, após essa data, sua dedicação foi na sua formação acadêmica. E para nos aproximarmos mais de seus trabalhos, traremos artistas contemporâneos , o Grupo Sete +  com a exposição  “Revisitando Leila Reinert”, espaço Cultural Funarte , galeria Mario Schenberg , tendo a Leila como referencia em suas produções . Será uma revisitação dos trabalhos dela, com o objetivo de  percebermos o quanto é atual sua pesquisa e quais os reflexos na estética, na filosofia e na politica do corpo. 

Leila foi pioneira na fotografia do corpo, expos com os melhores artistas de sua época ( geração 90), como Rosangela Rennó, Rochelle Costi, Claudia Jaguaribe, Rubens Mano entre outros.   Pesquisas que punham o corpo em evidencia, Leila associa a paisagem de seu corpo ( destituído de individualidade) à paisagem da metrópole. Segundo Tadeu Chiarelli , do Museu de arte Contemporânea de São Paulo , escreveu que : o desejo de Leila Reinert de mostrar a impossibilidade de identificar o outro e a si mesmo numa sociedade esfacelada como a atual, criou a necessidade de contrapor a nitidez da fotografia , um certo embaciado, conseguindo através de operações técnicas no processo de produção e/ou revelação da imagem. Ou seja: uma das característica mais marcantes da produção fotográfica que surge no Brasil entre os anos 80 /90 é que ela tende a se apresentar não mais como uma imagem fotográfica bidimensional, plana e objetiva, mas se expande pelo espaço tridimensional da sala expositiva, querendo ganhar uma espessura real e não mais apenas virtual. 

Participantes da Grupo Sete +: Ana Carmen Nogueira, Antonio Cavalcante, Azeite de Leos, Gustavo Prata, Julia Benetton, Maria Luiza Mazzeto, Mariane Cavalheiro, Maurity Dami, Marietta Toledo, Milton Blaser, Otavio Zani, Raphaelle Faure-V, Rodrigo Gontijo, Sheila  Kracoshansky, Simone Fonseca e Sueli Rojas 


Sobre a artista Leila Reinert

E A MEMÓRIA INSISTE
Leila Reinert

Lendo sobre Deepfakes, vídeos realistas feitos com inteligência artificial para manipulação informações, adulteração de imagens e áudios, criando um algoritmo de um usuário anônimo – um conjunto de regras e padrões lógicos – modelos computacionais inspirados
no cérebro humano, sobrepor voz e imagens da vítima escolhida ao rosto de pessoa do vídeo original. Estamos acompanhando uma realidade sintética.
Leila Reinert já estudava a manipulação que fazemos dos nossos corpos e dos nossos sentidos. Ela já estava muito a frente do seu tempo, talvez antecipando as Deepfakes, Fake News, estudando neurolinguística, o designer e a arte.
No ano de 2009, Leila elaborou um projeto no Sesc Pompeia – “Entre o corpo e o espaço sempre há uma coisa”– , que foi desenvolvido por um grupo de aprendizes que ela coordenava e orientava. A partir do estudo sobre a plástica formal dos objetos e
sua contextualização no mundo, sua articulação entre corpo, espaço e o sentido que cada um deles carrega, foram elaborados projetos que ultrapassaram o objetivo inicial da proposta, o exercício do pensamento.
Num mundo em que a força motriz da produção está no trabalho imaterial – e o maior capital é o capital humano, gerando um abuso de si – , voltar a pensar o corpo, parece uma das ferramentas para a reflexão sobre do que hoje se denomina sustentabilidade e a
subjetividade da existência. Voltando um pouco no tempo, em 1991, no começo de sua carreira artística, Leila já produzia trabalhos em que os corpos já eram mutilados, manipulados, com porções limitadas de matéria, que ela chamava de corpos urbanos, orgânicos, metálicos, cartográficos, pedaços, recortes ampliados do avesso e do direito, de um dentro e de um fora. Ela buscava o volume e o entre e sai de uma superfície maleável e mutável, ou seja, o movimento da vida. Para isso utilizou materiais moldáveis, como tecidos, barbantes, palha de aço, estopa, papel, algodão, que permitiam formata-los, como se fossem esculturas. O tato com a superfícies irregulares, superfícies que atraem e repelem, são corpos soltos, parecendo órgãos. Leila Reinert, formada em artes visuais e design, doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP, desenvolveu pesquisas que enfocaram a percepção sensível na comunicação de pensamentos sutis. Entendendo a multiplicidade dos campos de conhecimento que abrangem o fazer artístico referentes à memória e ao aprendizado, que refinam nossa percepção sensível.
Em 2001, Leila se debruçou na fotografia. Na exposição “Quando a fotografia é encontro de Peles”, ela experimentou a fotografia e seu campo de luz. Sua experiência foi dos materiais como a caixa preta, papel fotossensível e um corpo, e aglutinante Luz (Pin-Hole).
Um corpo intermediário graduando a luminosidade, um desenhar com a luz, o pequeno orifício na caixa de papel preto que permitia a justa entrada de luz, Etant Donnes… Considerando a estrutura como aquilo que condiciona o conjunto do campo perceptivo, o que pode ver de um mundo sem outrem, nem sujeito que olha, nem objeto olhando, mas eterno presente onde a consciência e seu objeto não fazem mais do que um. Fotografar
para Leila, com uma caixa preta era, no fazer, eliminar outrem. Não havia desejos, não havia outros mundos possíveis, mas somente abandono ou desapego.
Um pensamento se constrói a partir da experiência, não mais a manipulação da imagem; faz-se necessário manipular o próprio olhar, a para além de um corpo. é o corpo da imagem que se apresenta.
No texto crítico da curadora Stella Senra, 2001, para exposição “Quando o cotovelo vira coração, poderá a dor dar?” está consignado que o nome da exposição já reflete o que o expectador pode esperar. Inicia-se pelo título da exposição: uma pergunta que se vale de um o jogo fonético com as palavras (dor/dará) e a sugestão de um deslocamento (coração/cotovelo), que evoca ainda a metáfora “dor de cotovelo”. Até mesmo a dúvida na forma de indagar, ou seria uma ironia?
Nessa mesma exposição, há duas placas de vidro quadrado levemente apoiadas uma sobre a outra com orifício no meio; de cada lado desse orifício, elevam-se dois moldes em parafina na forma arredondadas de dois joelhos – lembrando Duchamp em
suas colagens e o Grande Vidro. Em 2001, na exposição “Uma luz é algo mais que um fato curioso”, onde são fotografadas garrafas, nota-se um tipo de pintura reversa, as camadas de cor das fotografias são retiradas com cândida. Depois as fotos são fotografadas novamente para, depois, serem ampliadas. O resultado é impressionante e inovador. Na exposição “A casa é o habitat do hábito“, 2001, Leila parece ter vivido a pandemia, pois retrata as repetições diárias, as manias, os deslocamentos do corpo, o lado da cama, o lugar, a mesa.
Meros detalhes, mas que constituem nosso lugar ao mundo, o “habituar-se sempre de novo”. Segundo Leila: “Em instante, muito menos que um segundo, um pequeno lapso, em fotos com um longo período de exposição, o tempo se alonga e um instante pode durar horas. O diafragma é aberto e a película lentamente bombardeada pela luz enquanto o fotografo espera. Quinze minutos. Quarenta, uma hora ou mais, quando a foto se revela, é ainda o instante que se apresenta, mas o instante de um tempo concentrado, denso”.
Assim é o trabalho: fotografias que desvendam os espaços do hábito, sugerindo um estranho aconchego.
Em 2002, Leila expôs na Funarte, “Da alternância dos ritmos”, uma instalação, onde utilizou uma ferramenta que ela mesma produziu, e com qual tirou fotos sob diferentes ângulos, dependendo da luz. Os resultados foram extraordinários. Na exposição “Amor e Falto-retratos”, 2006, Leila nos apresenta um vídeo e fotografias. São blocos de fotografias e um vídeo experimental que compõem a exposição Amor e Falto-retratos. Fotos de um corpo, do quarto e de rosas, temas clichês na história da fotografia. Tudo, aparentemente, muito banal. E é bem do que se trata nessas fotografias, de pura aparência inventada pela luz. São imagens frágeis e fugidias de corpos “quase” ausentes, que evocam o trágico. Pois, como afirmou Jean-Luc Godard, em Detetive: A catástrofe é a primeira estrofe de um poema de amor. Assim também o vídeo se comporta, uma linha desenhada a partir de uma fotografia do perfil de dois amantes, põe-se em movimento ao som de um texto extraído do “Tratado do amor Cortes”, de André Capelão. A sobreposição da voz embaralha a fala e dificulta a compreensão. Atordoar é a função. Em 2003/2008 Leila nos apresentou “Noites Brancas”, fotografias onde o tempo se apresenta como embalsamar do instante, tornando-as eternas num lapso. São visões que ela capta de sua janela, de lugares, de fotos noturnas, tiradas com longo um período de exposição, ou seja, o diafragma da câmera permanece aberto por muito período. Leila procura, dessa forma, discutir qual é a duração do instante, e qual é o resíduo de memória do olhar distraído do fotógrafo, não pela multiplicidade do entorno, mas pela pouca capacidade de concentração.
Leila, na sua riquíssima criação, nos legou muitos cadernos de artista e anotações preciosas do seu pensamento. Neles deixa eternizados registros de um fazer constante, quando diz que: “minhas obras representam uma maneira de pensar e de articular ideias. E hoje nem era uma noite de lua cheia, mas todos estavam presentes, um mundo dos possíveis”.

Loly Demercian

Exposição Crônicas Daquele Dia

Artista Juan Reos


Sobre a exposição

Crônicas daquele dia

Juan Reos, Buenos Aires, Argentina, 1983

Juan Reos, argentino de Buenos Aires, guarda um fascínio pela paisagem de sua terra. Encantado pelo Pampa, encontrou-se com as nuvens dessa grande planície de pradarias e campos abertos.

Ao penetrarmos na galeria, as obras distanceadas da parede, em pequenos estandartes desfraldados (Fig 1), reagem à passagem do visitante com o ar que se desloca.

     Fig 1

E, em cada imagem, um espaço em recuo abre a cena total: vinte e quatro modos de apresentar as luzes de um dia na vida de Juan Reos, esse artista que se aproxima da pintura metafísica mas, na verdade, é um colecionador de impressões vividas. Na presente mostra, Crônicas daquele dia, Juan nos oferece um encontro com reminiscências do ver os lugares vividos e perdidos, em atmosferas transcendentes, cheias de vazios, cavidades e coisas de onde sair e entrar.

Pedaços de territórios suspensos.

Fig 2
Fig 3
Fig 4
Fig 5
Fig 6

Os olhares voltam-se à procura de recolher a aura do amanhecer até o anoitecer (Fig 2 a Fig 5), o início, o princípio que se dobra sobre sobre si mesmo, o acontecimento fugidio, incontrolável e circular do tempo diário. Por sobre essas superfícies iluminadas, um dia passa e “códigos sem significados” (Fig 2), nas palavras do artista, desenham-se à busca de algum acidente soberano. Dançam por sobre a abóboda celeste fiapos de nuvens (Fig 3) que se desprenderam do fundo à procura de um entre-mundo (Fig 4), deixado ali pelas lembranças da paisagem vivida. Ficção, simulacros, fragilidade, história e memória sustentam a imagem por dentro (Fig 5) e nos fazem tatear ao redor das inquietações de Juan.

Na presente mostra, Crônicas daquele dia, em cartaz a partir de 18 de novembro, na Casagaleria, Juan transforma suas interrogações em pinturas orquestrando essas heranças próprias e referências fundamentais da arte e da história da arte. Juan ilumina sua poética de arqueologias escavadas no próprio ser e as reveste com seus resíduos. Um vídeo completa as referências. De aberturas fantásticas, pequenos cenários anunciam o dia e sua passagem, situando a temática da exposição em alguns limites da representação.

Juan Reos nasceu em Buenos Aires, Argentina, em 1983. A pintura é a linguagem onde guarda todos os indícios e restos dos diálogos estéticos feitos em lugares onde esteve. Em 2014, participou da Residência Artística da Fundação Armando Álvares Penteado, São Paulo e em 2019, fez a Residência Artística De Liceiras, no Porto, em Portugal. Seu questionamento como pintor está ao lado dos rumos da arte contemporânea, ao lado da performance, instalações fotográficas, vídeos e a própria arte na web. Desdobramentos dessa pesquisa plástico-visual puderam ser vistos em exposições individuais e coletivas em São Paulo, Paris e Montevidéu. Em 2018, conquistou o primeiro prêmio no concurso Itaú de Artes Visuais, Argentina. Atualmente, é professor na Cátedra Bissolino da Universidad Nacional de las Artes – UNA, Argentina, a mesma em que se tornou Bacharel em Artes Visuais.

Todos os aspectos da exposição Crônicas daquele dia situam uma linguagem significativa para a arte atual, cujas malhas deixam passar o olhar de Juan Reos que vê nas sombras da sua cultura as tessituras de um mundo que não pode ser desfeito.

Carmen S. G. Aranha[1]


[1] Professora Associada Sênior do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC USP) e do Programa de Pós Graduação Interunidades em Estética e História da Arte da Universidade de São Paulo (PGEHA USP). Autora do livro Exercícios do Olhar. Conhecimento e Visualidade (UNESP, FUNARTE, 2008).

Exposição Pertencimento

Sobre a exposição

Otavio inicia uma investigação dos processos e dos fenômenos materiais para criar estruturas em suas composições, ressaltando a preocupação de não operar sobre a superfície dos papeis. Ele utiliza as tramas que surgem no papel poroso – de ambos os lados – e as texturas da madeira. A sensação de pertencimento, de algo que não foi imposto ao suporte, só se cumpria pela sua capacidade de acentuar a presença do meio que as abrigava, o papel. O esforço para dar às linhas uma desenvoltura mínima, a busca de limites, tem como contrapartida a descoberta de uma inserção que ativa os campos com uma força inesperada.

Segundo Baudelaire, “a percepção pertence desde início à lembrança”. Nesse sentido, a nova produção do artista visual Otávio Zani busca em suas memórias e lembranças traços de uma permanência nesse mundo. Existe uma memória permanente que mantém a identidade das coisas.

Nos trabalhos anteriores que estão presentes na exposição, Otavio analisa a linguagem por outros caminhos: inicia uma certa subversão dos procedimentos e percebe que o peso gráfico é um fator compositivo que o interessa, além de uma certa imperfeição da impressão que dá possibilidade para que a imprevisibilidade comece a pairar sobre os planos gráficos. São várias técnicas executadas com fluidez. Ao passar de uma técnica para a outra e sem que uma se sobrepuje à outra, Otavio tece uma rede na qual o fazer vai situando as manchas da memória.

Nessa nova produção, propõe-se que as possibilidades das direções das linhas sejam horizontais e verticais. Os traços são mais marcantes, assim como a palheta reduzida, evidenciando a opacidade de um solo, as espessuras camadas pictóricas, a terra. As intervenções cromáticas, em tons marrons, de terra queimada. As cores básicas do interior de São Paulo onde sua família morou. A paisagem do interior do Estado de São Paulo surge aí como uma âncora na história, uma relação emotiva com o passado.[1]

São percursos do esquecimento essencial que, uma vez intensificados por uma luz, um odor, um gesto, projetam-se em visualidades nos materiais e procedimentos da impressão gráfica.[2]

Loly Demercian


[1] Peixoto, Nelson Brissac. Paisagens Urbanas. Ed.marca d’agua. Senac.São Paulo, 1996.

[2] Aranha, Carmen. Livre-Docente em Teoria e Crítica de Arte pela Escola de Comunicação e Artes da USP – ECA USP (2001). Professora Doutora (MS-3) (1993-2000) e Professora Associada (MS-5) do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo – MAC USP (2000-2016). Professora Associada Senior a partir de dezembro de 2016 – MAC USP.

Exposição Tempos que Habitam em Mim

Sobre a exposição

Carlos Habe 1, 2022

O título escolhido pelo artista Azeite de Leos para essa ex- posição (que tem a intenção de ser uma reavaliação dos últimos 10 anos de sua produção artística) não poderia resumir de melhor forma a questão que permeia toda a sua obra: a impermanência, a tentativa vã do homem de transcender seu tempo e de “deixar uma marca”. Segundo a galerista e historiadora da arte Loly Demercian 2 “Azeite de Leos nesses últimos dez anos, fez uma retomada, uma reestruturação em seu fazer, e olhando para trás, nos trabalhos realizados, foram marcados por um tempo que ali existiu, e, ao questionar a integridade da matéria, trás a tona a nossa própria fragilidade e efemeridade”.
O tempo não retrocede, o tempo não avança, apenas é. O tempo existe. Sempre! A infinitude do tempo é o contraponto irônico de todo o desejo do homem de construir algo que perpetue, que não tenha fim. Essa antiga (e eterna) problemática do homem de agir/construir/criar apesar do tempo, parece se manifestar fortemente na pesquisa artística de Leos. Podemos encontrar em toda a sua produção o diálogo estabelecido entre a ação do homem e a ação do tempo. No começo de sua trajetória, a base de sua produção artística estava fundamentada nas intersecções entre desenho e escrita, enquanto manifestações possíveis de ambos no campo do fluxo de pensamento e da criação de narrativas, como explicitado pela artista e pesquisadora Beatriz Rauscher 3 em seu texto “Onde o desenhar coagula” 4 so- bre a obra do artista: “O eixo dos investimentos poéticos de Azeite de Leos está na intersecção entre desenho e escritura. O desenhar é ação fundadora e construtora das micronarrativas criadas por ele, trata-se de um desenhar se fazendo, um desenho fluído e em fluxo”. E se este desenho se manifesta na forma de um fluxo (ou seja, o modo contínuo, o curso constante), cada trabalho poderia então ser percebido como uma forma de registro (registro do pensamento, registro do movimento do corpo, registro de um momento). Portanto, era natural que o artista começasse a se interessar, dentro de sua pesquisa plástica, pelas possibilidades do suporte, por dar um caráter envelhecido ao suporte do de- senho – se o desenhar era o registro da ação do homem, do pensamento, do gesto e, principalmente, de um instante, o suporte, portanto, precisaria “denunciar” a passagem do tempo.
Inicialmente, Azeite de Leos oxidava, sujava e “maltratava” o papel no qual posteriormente iria desenhar, mas aos poucos percebeu que esse procedimento não era muito “autêntico e sincero” e, gradativamente migrou do papel para telas nas quais registra a passagem do tempo ao serem impressas por muros deteriorados. Essa mudança de suporte possibilitou novos procedimentos para a realização dos desenhos, os escritos eram realizados com tinta, linhas “em negativo” surgiam ao utilizar ponta seca, gravetos ou qualquer outro instrumento para desbastar manchas feitas de betume e marcar as texturas que surgiam a partir dos resíduos dos muros depositados na tela.
“Essas marcas que o artista enfatiza e revela, são desenhos que se produzem como uma gravação. O gravar tem origem nas primeiras manifestações do homem, que com instrumentos de corte fazia incisões sobre as superfícies para registrar algo assim, o gesto da gravação traz, além do sentido expresso na imagem ou texto executado, o sentido de permanência, de durabilidade daquele gesto. Então, incisão e corrosão, como as marcas contundentes nessas superfícies, trazem para o trabalho a qualidade da cicatriz” 5 .
Esse novo resultado estabelecia o confronto entre o registro da ação do homem (o gesto, o desenho, a escrita) e o registro da ação do tempo (impressão dos muros). Remetendo a uma visualidade de um mundo em transformação, de paisagens urbanas à deriva.
Em sua última série de trabalhos, Azeite de Leos retira as texturas e os substratos/resíduos do mundo e os recompõem em camadas, mas deixa essas camadas bem definidas, não as sobrepõem de modo que resultem em uma fusão. As imagens dos muros são registradas em monotipias (agora, em pedaços de tecidos, não mais em uma tela montada em um chassi) e depois utilizadas, através de colagens e de justa- posições, para compor “quadros” que, por sua vez, configuram representações de diferentes tempos, um diálogo de diferentes “marcas” (do tempo, da matéria, dos gestos e escritas dos de- senhos).
Nesses trabalhos, ainda percebemos os planos distintos, as camadas que, em suas últimas produções, chegam a se “de- pendurar” do chassi – neste caso a utilização do chassi ganha importância por ser um comentário acerca do status da arte – suportando de forma precária as camadas de tecidos. Essas “lascas de tempo”…
Registros, depositários, testemunhas do tempo. O debate sobre o suporte e a constituição de uma poética do registro é o que torna Azeite de Leos um dos artistas mais interessantes de sua geração. Seu trabalho não reflete a experiência contemporânea de velocidade, de “flash”, de superficialidade de dados… mas se constitui como um ato de resistência, de resgate da materi- alidade, resgate de experiências mais íntegras com as coisas do mundo. A experiência do agora.
 


1 HABE, Carlos. arteterapeuta, arte-educador ; é mestre em teoria, Crítica e História da Arte pela FASM- SP, especialista em
avaliação de aprendizagem pela PUC-Cogeae, psicopedagogo pela UniFieo e arte educador pela FAAP-SP; é professor do curso de pedagogia da Unifae.

2 DEMERCIAN, Loly. Doutora em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo , é membro do Grupo de Pesquisa em Comunicação e Criação nas Mídias (CCM) da PUC/SP. É curadora independente. Realizou mais de 30 exposições em artes visuais e projetos culturais. Autora dos livros: Arte/Educação no Ensino Médio: Um estudo sobre a utilização das novas mídias / Diálogos Possíveis: o tempo e a duração na videoinstalação.

3 RAUSCHER, Beatriz é artista; doutora em Póeticas Visuais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul; foi bolsista CAPES na Université Sorbonne Nouvelle – Paris III; é professora no Programa de Pós- Graduação em Artes da Universidade Federal de Uberlândia (UFU-MG) e líder do Grupo de Pesquisa “Poéticas da Imagem” UFU/ CNPq.

4 Em seu texto Onde o desenho coagula feito para a exposição Entre Processos do artista Azeite de Leos, Beatriz Rauscher recorreu as ideias em torno do conceito de “arqueologia da impressão” apresenta- do pelo filósofo Georges Didi-Huberman em sua obra La ressemblance por contact.

5 RAUSCHER, Beatriz. Onde o desenho coagula.

Exposição “Calma Tormenta”

Artista Julia Benetton

Texto crítico: Loly Demercian, 2022

JULIA BENETTON nasceu em Piracicaba (1992), tem formação em design gráfico e bacharelado pela FAAP/SP e Design Communication pela University of the Arts (UAL) em Londres/Reino Unido. Realizou exposições na: Escola BauhausPiracicaba, SP – Brasil (2018); “King’s Cross Illustrator’s Christmas FairLondres”, Reino Unido (2016) e Centre Du Graphisme d’ÉchirollesÉchirolles – França (2015). Transitou por diversos países, com diferentes culturas, desde a Inglaterra até as ilhas escondidas no Vietnã.

Para falar sobre a artista visual Julia Benetton é necessário retroceder-se um pouco para suas primeiras pesquisas, anteriores à pandemia. Suas pesquisas na primeira olhada revelaram-se como trabalhos eróticos, sensuais e gestos rápidos. Com agilidade expressionista, descortina uma intimidade com os pinceis e desenhos. As cores escolhidas, a saber: os vermelhos, verdes, cores puras, foram muito usadas pelos artistas expressionistas alemães , especialmente Egon Schiele, com  estilo mais agressivo e trágico. Julia se aprofundou neste último artista, estudando os  matizes, tons  vermelhos , laranjas e o sofrimento aliado à sexualidade. O artista brasileiro que mais se aproximou dessa estética foi Flavio de Carvalho, que, em obras inéditas das gravuras e desenhos, retratou o corpo feminino com traços fortes e marcantes.

Os trabalhos com nus femininos de Julia, com suas linhas e cores fortes, sugerem, paradoxalmente, que a nudez já não importa tanto, mas sim o que está dentro da pele, o que reveste o corpo. O que o corpo suporta.

Com a pandemia, Julia fixou sua morada no litoral norte de São Paulo, lá pode refletir um pouco sobre sua estética, o modo como pintava e desenhava. Sua vida se tornou mais leve; o mar e a vegetação foram sua inspiração para viver o presente.  A verdade é que o isolamento imposto pela pandemia forçou pessoas a se confrontarem consigo mesmas. Nesse processo, muita gente repensou suas rotinas e deu viradas bruscas de emprego, endereço ou relacionamento.

A sua própria atividade cultural e artística diversificou-se e novos temas, impensáveis no passado, passaram a interessá-la como motivos para seus novos trabalhos e as suas pinturas. À semelhança do que ocorreu com Jean- Baptiste Debret (1768-1824) que em sua longa permanência no Brasil, colocou-se com uma realidade totalmente diversa, pitoresca, deixou o neoclassicismo e foi atraído pelo colorido dos produtos naturais encontrados em nosso País, pintando laranjas, bananas, abacaxis, mangas, e outras frutas exóticas, numa composição original, além, dos assuntos indígenas e paisagens.

Julia liberou sua imaginação nas pinturas de paisagens do Litoral Norte de São Paulo (São Sebastião), registrando seu cotidiano, como as ondas do mar, a exuberância da floresta, as plantas litorâneas, rios, riachos, imortaliza na pintura. Esses trabalhos estão em “Vagator Beach (2020); “Entrelaço das folhas” (2021); “Palma tranquila” (2020); “Calma Tormenta” (2022); “Guaimbê” (2019); “Saudação ao sol” (2021) e ‘Abacaxi” (2018), dentre outros.

Sua versatilidade será mostrada na exposição “CALMA TORMENTA”, na Casagaleria e oficina de arte Loly Demercian, a partir do dia 08 de julho a 06 de agosto de 2022. Nesse momento de tranquilidade, Julia descortinou outras frentes, como a atividade de muralista e decoração de ambientes, trazendo diversidade nas criações e uma poética personalizada para cada projeto.  Contaremos com uma pintura na parede da galeria, mostrando sua versatilidade de produção.